quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

TERRA, TRABALHO E PODER: O MUNDO DOS ENGENHOS NO NORDESTE COLONIAL.

Texto 2 – TERRA, TRABALHO E PODER: O MUNDO DOS ENGENHOS NO NORDESTE COLONIAL.

- A existência de terras férteis em abundância parecia, à primeira vista, convite à pequena exploração agrícola. A agricultura de subsistência não foi o interesse predominante da exploração de novas terras. Ao longo de três séculos a colonização portuguesa objetivaria primordialmente a acumulação de riquezas e o fortalecimento do Estado, através da produção para o mercado europeu. A nova terra não dispunha de especiarias imediatamente comercializáveis nem de metais preciosos capazes de estimular a efetiva ocupação. Por trinta anos, os territórios da América Portuguesa foram relegados a segundo plano, enquanto a Coroa dedicava-se à conquista e exploração do Oriente.
- Se o Brasil não interessava a Portugal, a cobiça de outras nações européias, como França, cujos navios freqüentavam assiduamente o litoral brasileiro. Só então o domino da América passou a preocupar a monarquia portuguesa. A Espanha descobrira metais preciosos em suas terras e a perspectiva de descobertas semelhantes no Brasil exigia a manutenção dessa posse.
- Como mobilizar o interesse do capital mercantil, motivando-o a investir na Colônia e prover sua defesa? No caso da América, a ocupação fora possível pela descoberta de metais preciosos em abundancia, que praticamente autofinanciaram a colonização. - Necessário trazer colonos em quantidade, para garantir o esquema de guarda de extensa costa. Tal preocupação influi na implantação do sistema de capitanias hereditárias: incentivo para o estabelecimento de um mínimo de núcleos populacionais, provedores da guarda do território.
- A primeira capitania do Brasil (Pernambuco). De 10 de marco de 1534, encontramos: A viabilização da empresa exigia, porem, a escolha de atividade lucrativa capaz de sensibilizar os colonizadores, pelas facilidades oferecidas e pelos lucros potenciais. A produção de açúcar foi solução amplamente justificável: Portugal já possuía experiência em sua produção, desenvolvida no século anterior nas ilhas do Atlântico. O Brasil possuía terras em abundância e o açúcar poderia ser produzido em larga escala (necessidade de defesa, de fixação de colonos e de produção lucrativa), no momento do inicio da colonização, marcaria a especificidade da ocupação do Brasil. A exploração econômica definiu, depois, os rumos da Colônia.
- A época sobrelevou a necessidade de efetiva ocupação e defesa do território, que, requerendo aproveitamento econômico da terra, teve na empresa açucareira elemento de atração dos colonizadores, incentivo aumentado pelas isenções e estímulos emanados da Coroa. O empreendimento colonial português no Brasil exigiu certa retaguarda demográfica para sua efetivação, variando humano branco, a fundamentar o universo social da economia escravista, necessitando, ao mesmo tempo, uma espécie de estrutura urbana responsável por atividades administrativas, militares e religiosas. Prover tal base populacional foi também preocupação da Coroa portuguesa, pois, além da carreação de capitais para o erguimento de engenho, era mister atrair colonos para compor o suporte mínimo de ocupação e defesa.
-A preocupação em atrair colonos para garantir a defesa revela-se especialmente, no pedido para que El-Rei obrigasse os beneficiários de doações de terra a residirem no Brasil. Mesmo com a criação do Governo Geral, em 1548, as preocupações com a defesa, fixação de colonos e descoberta de metais preciosos mesclavam-se sempre a incentivos para o desenvolvimento da produção açucareira. O regime de Tomé de Souza, de 1548, determinou a doação, separadamente, de terras para engenhos e de terras para o trato dos canaviais. No caso, a divisão entre lavouras e engenhos objetivava a atração de colonos dotados de menores recursos, mas que efetivamente se fixam na nova colônia, incentivando-os a participação do trato das lavouras, na medida em que o domínio do território exigia, sem duvida, a ocupação das terras por súditos portugueses.
Escravismo e Latifúndio
- O requisito primeiro para aproveitar a terra era posse de escravos, pois se os moradores desta Costa do Brasil todos tem terras de Sesmaria dadas e repartidas pelos Capitães da terra, a primeira cousa que pretendem alcançar são escravos para lhes fazerem e granjearem suas fazendas, porque sem eles não se podem sustentar na terra.
- A gênese do escravismo moderno está profundamente liga da à articulação de grandes unidades produtivas, voltadas para o mercado europeu. A produção em larga escala, para um mercado distante e sem qualquer ligação imediata com o consumo, exigia grande contingente de trabalhadores que se submetessem a trabalhar para outros, sem terem, eles mesmos, qualquer motivação pelo processo de produção. E desde o final da Idade Média florescia, nas plantações de cana-de-açúcar do Mediterrâneo, o uso da escravidão.
- Granada era uma colônia italiana. Surgia associada ao açúcar, uma estrutura de produção comercial, exigindo largos recursos e com base no trabalho escravo, cristalizador do complexo latifundiário monocultor.
- O desenvolvimento da produção açucareira no Algarve e nas ilhas do Atlântico foi o ponto de partida para a utilização sistemática do braço negro. Era a constituição de nova forma de organização de trabalho, sem parâmetros na Europa, a exigir novas categorias de trabalhadores, alienados de tudo: dos meios de produção, de suas origens, de sua liberdade. Aparentemente, chocam-se aqui duas explicações sobre o escravismo moderno: a que atribui sua origem à necessidade de limitar o acesso à terra e a que remete a utilização do trabalho escravo à criação de uma nova categoria de trabalhadores, dirigidos pelo capital mercantil. A questão da fronteira aberta, ou seja, à existência de grande abundancia de terras passíveis de serem ocupadas. O escravismo impedia a apropriação e ocupação de terras por colonos povoadores (que desenvolveriam produção para o próprio consumo).
- Essa analise fundamenta-se nas reflexões de Marx sobre a teoria da moderna colonização, e foi retomada por Eric Williams, para quem, nas colônias produtoras de açúcar e fumo, a “terra e o capital eram inúteis a não ser que o trabalho pudesse ser controlado”, pois sem a compulsão “o trabalhador exercia então sua inclinação natural para cuidar de sua própria terra e labutar por conta própria”. Do contrario, dada a abundancia de um fator de produção (a terra), o resultado seria a constituição no Ultramar de núcleos europeus de povoamento, desenvolvendo uma economia de subsistência voltada para o seu próprio consumo. Barros Castro criticou severamente essas analises. Para ele, “não faz sentido falar em escassez de oferta de mão-de-obra em Portugal, e isto, independentemente de haver ou não uma grande quantidade de pobres sem terra”. Por razões semelhantes, não é possível explicar a escravidão nas colônias pela tese fronteira aberta – trabalho compulsório.
- Na cadeia dos provedores de mercadorias coloniais, o cativo não constitui uma alternativa para o trabalho livre: o escravo é ali socialmente necessário, o escravismo é, no engenho, um recurso ou mais primitivo para viabilizar o mais moderno, o escravo de engenho, não obstante a brutal primazia da relação homem (senhor, feitor) a homem (cativo), é um atalho em direção ao moderno proletário. Segunda vertente de explicações: o escravismo como formas possíveis e adequadas à constituição, nas colônias, de mão-de-obra para capital, representam formas peculiares de organização social do trabalho para a obtenção, sob garantia absoluta, do lucro capitalistas, e ambas se configuram pela concentração em um mesmo lugar de trabalho, e em larga escala, de trabalhadores despossuídos de meios de produção e de saber técnico.
- O recurso ao trabalho escravo poderia ser explicado com o argumento de que, na colônia, seria impossível a preservação de homens livres, na condição de expropriados, dada a abundância de terras, onde todos poderiam encontrar meios de se auto-suprirem. Ocorreu numa época em que jamais poderiam ter sido utilizados homens livres, pela muito simples e muito forte razão de que o sujeito expropriado dos meios de produção obrigado a vender sua forca de trabalho não existia como categoria social, capaz de preencher as necessidades de mão-de-obra requeridas pela produção colonial. A existência de ampla oferta de terras, no início da colonização, nada significaria sem os recursos materiais para a implantação da produção açucareira e, principalmente, sem braços. A preocupação da Coroa era trazer brancos associados ao açúcar, à dinâmica de uma produção mercantil e não, simplesmente, ao esforço de uma política de povoamento. A vinculação inicial da doação de terras à produção açucareira determinava, de antemão, o tipo de colonização o papel do branco, pois a produção do açúcar era “naturalmente” entendida como labor de escravos. Para esse tipo de trabalho não se concebia, realmente, à época, a atividade de um homem livre.
- Exatamente essa historicidade da mão-de-obra nas colônias, no contexto do capital comercial, embasa as explicações de Eric Williams e Fernando Novais. Para o primeiro, quando a escravidão é adotada, não é adotada como uma escolha em detrimento do trabalho livre; não há qualquer escolha. Não havia no século 16 os trabalhadores livres necessários para cultivar cana-de-açúcar, tabaco e algodão no Novo Mundo. A escravidão negra, portanto, era apenas uma solução, em certas circunstâncias históricas do problema de mão-de-obra das Antilhas. Montaram a colonização, a produção escravista (ou paraescravista) devia apresentar-se , como observou Eric Williams, quase como natural, tal o condicionamento histórico-econômico em que se movia a expansão européia.
- Retomando o percurso histórico da produção de açúcar na época Moderna, percebe-se como o escravismo desenvolveu-se inextricavelmente ligado ao complexo açucareiro mercantil. Produzir com escravos era produzir mais, em grandes propriedades, excluindo os pequenos produtores. E se é certo, portanto, ser a restrição às terras, por assim dizer, estrutural, era pelo escravismo que ela se dava. Pois, como base da produção açucareira (e depois, de outras culturas de exportação), correspondia à dinâmica do capital mercantil, a criar essa forma de produção para garantir a realização de seu lucro. De outra maneira não poderemos entender por que, como acentuam Heers e Verlinden, ter o escravismo moderno surgido justamente nas culturas novas, ligadas às atividades mercantis de larga escala. E a semelhança da organização da produção açucareira às formas de organização manufatureiras européias não é simples coincidência.
- Há, pois dois movimentos a apreender no processo de constituição da moderna produção mercantil escravista. De um lado, a centralização e a concentração da produção, dirigidas pelo capital mercantil e que pressupunham o monopólio de terras para suas determinações. De outro, mas no mesmo processo de constituição da moderna produção mercantil, essa concentração exigia ponderável número de um tipo especifico de trabalhadores, o que só era possível, naquela época, pela compulsão.
- Em seu sentido mercantil juntamente com o processo de acumulação de capitais, a produção de açúcar aparecia como “naturalmente” possível em grande escala, carecendo de braço escravo e de largas porções de terra. Produzir com escravos era produzir mais, excluindo os produtores não escravistas: a produção escravista em larga escala dependia de grandes extensões de terra para sua expansão, que queria mais e mais escravo. No caso do Brasil a escolha do açúcar como produção para garantir a ocupação continha, em si, a dinâmica do capital mercantil específica dessa produção e pressupunha escravismo e grande propriedade, excluindo, praticamente priori, a pequena produção.
- Foi realmente necessário criar uma nova forma de trabalhador, trabalhando para o capital mercantil e não para si mesmo, garantindo a utilização da terra para o capital e para a produção externalizada. Mas é certo também que onde o escravismo se impôs, a apropriação de terras para outros fins e com outra forma de trabalho não era possível, e o colono branco esteve vinculado às transformações da produção mercantil e escravista.
- A racionalidade do capital mercantil, geratriz do escravismo enquanto trabalho alienado criava, na mesma dinâmica, empecilhos para o aproveitamento da terra fora de suas determinações. Por outro lado, considerar o escravo das colônias atalho ao moderno proletariado implica grande simplificação. Considerar a historicidade geral da época e distinguir a trajetórias diversas, pois enquanto na Europa completou-se a proletarizacão, nas colônias o escravismo permaneceu como barreira ao capitalismo. O sistema colonial e, conseqüentemente, o escravismo esteve inserido em situação histórica complexa. Pois o senhor de escravos o era enquanto parte do grande negocio colonial metropolitano: um vassalo, um agente da Coroa que arcava, embora com alguns privilégios ou vantagens e, por vezes, com algum suporte oficial, com a construção do Império Colônia. A terra não era uma riqueza e iria demorar algum tempo para que elas assumissem esse significado mesmo como conexão do capital mercantil, mas erigia-se na base material da transferência e da perpetuação de uma arraigada estrutura de privilégios.
* Estado, acumulação e colonização: A especificidade da época moderna
- É preciso considerar como a convergência de situações histéricas especifica dotou o jovem estado português de condições propicias para a expansão. Os problemas internos do feudalismo, geradores do avanço do comercio e da burguesia, conduziram ao processo de centralização política e a formação de monarquias nacionais absolutistas. No momento em que o comércio europeu debatia-se, restrito aos limites da economia ainda predominante feudal, e outras nações européias enfrentavam guerras, Portugal precocemente conhecia a estabilidade. O processo de sucessão dinástica que entre 1383 e 1385 levava ao trono D. João I permitira ao Estado efetivar as primeiras investidas expansionistas. Certamente havia outras vantagens, como sua localização geográfica e a dilatação do poder mercantil de sua burguesia. Mas, sem dúvida, a centralização do poder foi o elemento-chave, criador das condições da expansão.
- O Estado foi, nesse período, organizador das condições gerais de produção, incentivando novas vias mercantis, de arregimentação do trabalho e a atribuição dos fatores produtivos. A ele coube a extensão permanente de mercados e a criação de colônias. O Estado exerceu papel econômico fundamental no processo de acumulação primitiva de capitais. A organização da sociedade, a criação de instâncias de gestão e de controle da produção, sob a direção estatal, desenvolvesse com anterioridade à existência do capital enquanto relação social.
- As determinações das estruturas engendradas a partir do absolutismo, especialmente o sistema colonial, tiveram em elementos feudais subsídio material e, algumas vezes, certo substrato jurídico, mas as relações socioeconômicas surgidas constituíram elementos novos, em nova ordem. Pois o capitalismo, historicamente, não foi mero resultado da expansão do comércio e da dissolução do feudalismo. Os colonizadores buscaram usufruir rendimentos do tipo feudal. Os monarcas, todavia, obstaculizando poderes e taxações. Assim, desfrutar de certas rendas foi sempre concessão real, muitas vezes suspensa.
- Em sua formulação, a existência de um sistema mundial capitalista não implica uniformização das relações de produção ao modelo industrial, mas a subordinação de todas as relações à lógica do capital: Supunha uma divisão de trabalhos produtivos, que só pode ser devidamente apreciado tomando em consideração a economia-mundo em sua totalidade. A emergência de um setor industrial foi importante, porém, o que fez possível foi a transformação da atividade agrícola às formas capitalistas. Para analisarmos as características do sistema colonial, quanto à gênese e mesmo em sua ligação com o capitalismo, devemos ter em mente dois pontos. Primeiramente, as colônias são elementos vitais do processo de acumulação originaria de capitais (não – capitalista). Segundo, embora o sistema colonial seja importante alavanca para o surgimento do capitalismo, este não decorre linearmente daquele. O que vale dizer que não podemos estudar o sistema colonial em prisma teleológico, em mera cadeia de causas e efeitos.
- Sendo a economia metropolitana e a economia colonial parte de um todo interagente, o sentido mercantil anima o novo sistema mundial, historicamente, mas não determinadamente encaminhando-o ao modo de produção capitalista. Analisando-se, todavia, o quadro mais geral do período e levantando-se em conta ser seu traço fundamental as inaugurações de uma economia mercantil de dimensões geográficas mundiais, constatam configurações, quer ao feudalismo, quer ao capitalismo.
- Se, como já afirmamos supra, o conceito de economia mundial dá conta das profundas transformações que marcam a Idade Moderna, esse caráter de extensão geográfica do domínio mercantil europeu não é suficiente para categorizar o período como capitalista. O capitalismo mercantil agilizou as trocas, ativou a produção para a venda em escala, transformando os produtos em mercadorias. Num dado momento, porém, a simples expansão do capital mercantil mostrou-se insuficiente para gerar a produção e reprodução da economia-mundo, e, de elemento dinamizador do sistema produtivo, o capital mercantil transformou-se em condições de bloqueio do capitalismo. Por outro lado, a acumulação originária, embora condição prévia do capitalismo, não constituiu encaminhamento linear e direto ao modo de produção do capital.
- Nesta ótica, a transição é entendida como fase final do feudalismo e as analises centram-se no pressuposto do caráter ainda predominante da produção nos moldes feudais. As causas da crise geral do século XVII remetem-as às contradições intrínsecas da acumulação primitiva, ou seja, à criação de um mercado amplo a expansão, à existência de uma “classe capitalista” e a elementos da forma capitalista de produção de dentro de uma sociedade feudal. Justamente, essa primeira fase da transição teria sido a razão da crise do século XVII, criadora, por sua vez, das condições que fizeram possível a Revolução Industrial.
- A chamada crise geral do século XVII situa-se no centro do debate sobre a transição. A constatação de alterações de ritmo e de novos encaminhamentos sócio-político-econômicos coloca problemas cruciais para a conceituação de passagem do feudalismo ao capitalismo. A caracterização da crise do século XVII torna-se mais delicada para os que defendem a transição como período duplamente diferenciado do feudalismo e do capitalismo e cujo momento final é a Revolução Industrial do século XVIII.
- No primeiro momento século XV e XVI, espaço especifico, nem feudal nem capitalista. Seu argumento: “A transição do feudalismo para o capitalismo é desta maneira não um processo ininterrupto único, semelhante ao da transição do capitalismo ao socialismo – mas constituído por duas fases absolutamente distintas que põem problemas radicalmente diferentes e requerem ser analisados em separado.”
- Embora o período caracterize um sistema bastante poderoso para minar e desintegrar o feudalismo, foi demasiado fraco para desenvolver sua própria estrutura. Pôde apenas preparar o terreno para o avanço vitorioso do capitalismo nos séculos XVII e XVIII, o caráter pré-capitalista pode ser encaminhamento para designações do tipo capitalismo comercial, sendo a ênfase dada à exteriorização do processo, ou seja, à acumulação de recursos do setor mercantil e homogeneizador de diferentes formas de produção.
- A preocupação em torno da crise geral do século XVII, momento decisivo para a inauguração do moderno modo de produção, atém-se à Inglaterra, onde o desenvolvimento produtivo e o crescimento da burguesia encaminharam o processo de mudança para a via revolucionária, coroada pela Revolução Gloriosa e pelas modificações político-institucionais de 1688. Não se pode negar ser essa época da gestação das relações capitalistas, hoje dominantes. Há que se acautelar, porém, de se partir do pressuposto de o período de poder analisado já dentro da perspectiva capitalista.
- Essas considerações são imprescindíveis para o estudo da dinâmica histórica dos países ibéricos e do sistema colonial. Justamente porque Espanha e Portugal inauguram a expansão da economia mercantil européia no além-mar, criando impérios coloniais, estruturando novas articulações políticas internas e novas formas produtivas aceleradoras da acumulação originária. E se admitindo a particularidade do Antigo Regime pela emergência do Estado moderno, geralmente expresso em monarquias absolutistas, o problema de suas caracterização é ponto fulcral para a analise do período. As análises, em geral, ou tomam por referencia a evolução política medieval ou apontam para o Estado burguês. Todavia, a estruturação política do Estado moderno revela especificidades, na medida em que combina funções e atribuições, formando novas relações de poder, que constituíram os atributos de sua soberania: o monopólio da força, pelo domínio do poder e o controle de um exercito permanente; a substituição da camada sensorial pelos organismos burocráticos estatais, na apropriação do excedente econômico através de impostos; o monopólio da justiça, através da delegação desses poderes a organismos profissionais que remetem ao rei. O Estado moderno apresenta ter elementos que o diferenciam tanto da ordem política feudal, quanto do Estado burguês. Em primeiro lugar, destaca-se a total soberania do governante: sua autoridade não depende de nenhuma outra instância de poder. Estado e sociedade, por sua vez, aparecem como entidades separadas. Finalmente , o Estado identifica-se com a figura do monarca e este com o da própria nação.
- A instabilidade, o conflito, os obstáculos ao desenvolvimento da economia mercantil criaram os espaços para a emergência dessa forma política. E, essencialmente, a formação dos Estados absolutistas remete ao quadro da economia e da sociedade da Época Moderna. A idéia de Estado de transição fundamenta-se no pressuposto de nessa época ocorrer “defasamento cronológico entre o Estado absolutista e a instancia econômica do período de transição do feudalismo para o capitalismo”, pois as funções essenciais para aceleração da acumulação primitiva de capitais (expropriação dos camponeses, aumento da maquina fiscal, incentivo a produção, destruição de poder sensorial, incentivo às atividades mercantis) “só podem ser preenchidas por um Estado com caráter capitalista”. Essas características explicitar-se-iam pela centralização, fonte de todo o poder dentro do território nacional; pela dissociação desse poder desse poder de limites extrapolíticos, quer fossem morais ou religiosos; pela utilização do Exercito como representante do povo; pela emergência da burocracia como função política do Estado.
- O Estado parece descolado da dinâmica social, automatizado e distinto, qualitativa e temporalmente, em relação à economia e à sociedade. O absolutismo, por sua vez, nem é entidade que avança sobre o tempo, sendo capitalista, quando o capitalismo não existe; nem tão pouco paira sobre a sociedade promovendo o equilíbrio e tendo como fator de sua existência esse balanceamento das forças em conflito. Ao contrário, vive do conflito.
- Todos os Estados absolutistas possuíram elementos de dominação patrimonial. Toda via, a eclosão desses Estados, em diferentes estágios da dissolução do feudalismo e da ascensão da burguesia, implicou maior ou menor grau de dependência da burguesia mercantil em relação ao poder real. Tanto o modo de produção como a formação econômica são objetos históricos, não se podendo aceitar a redução do modo de produção a mera categoria estrutural e abstrata.
- Assim, a formação social seria uma totalidade e o modo de produção uma estrutura econômica determinantes das formas de consciência e das instituições. A formação social poderia ser, além do mais, composta de modos de produção diversos, dominados por um modo de produção que marcaria o caráter geral da formação social. E embora a nível formal o processo histórico revele traços remanescentes das estruturas feudais e apontem para o capitalismo, elementos realça, no período colonial, o caráter comercial da produção açucareira

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