sábado, 16 de janeiro de 2010

O ESPÍRITO DA HISTORIOGRAFIA

Segundo o autor José Carlos Reis, o espírito da historiografia pós-moderna se baseia na alteridade, da diferença regional e local; microrrecortes no todo social; apego à micronarrativa e à descrição densa em detrimento da explicação globalizante; no sentido de uma redefinição da interdisciplinaridade e do tempo longo; conseqüentemente abertura a todos os fenômenos humanos no tempo, com ênfase individual, no irracional, no imaginário, nas representações, nas manifestações subjetivas, culturais. Percebemos que essas idéias estão articuladas na concepção de Certeau.
Por isso, conforme Michel de Certeau, toda pesquisa historiográfica se articula com um lugar de produção sócio-econômico-político e cultural. E é em função deste lugar que se estabelecem o método em que se delineia uma série de interesses que os documentos e as questões que lhes serão propostas se organizam. Diferentemente da história positivista, que se trabalhava com a idéia de verdade dos fatos, hoje, toda interpretação histórica depende de um sistema de referência. É, pois impossível analisar o discurso histórico independente da instituição em função do qual ele se organiza silenciosamente, ou sonhar com uma renovação da disciplina, assegurada pela única e exclusiva modificação de seus conceitos, sem que intervenha uma transformação das situações postas.
A instituição determina a vertente histórica a ser seguida pelos historiadores, por isso, um novo texto histórico quer dizer, uma nova interpretação, uma nova escrita aliados ao exercício de métodos novos, bem como a elaboração de outras pertinências visando um deslocamento da definição e o do documento etc, é o produto de um lugar social. Se é verdade que a organização da história é relativa a um lugar e a um tempo, isso ocorre, por causa de suas técnicas de produção.
Para Certau, este é o momento mais produtivo, pois em história tudo começa com o gesto de separar, de reunir, de transformar em documentos certos objetos distribuídos de outra maneira. Enquanto a pesquisa é interminável, o texto deve ter um fim e esta estrutura de parada chega até a introdução, já organizada pelo dever de terminar. Também o conjunto se apresenta como uma arquitetura estável de elementos, de regras e de conceitos históricos que constituem sistema entre si e cuja coerência vem de uma unidade designada pelo próprio nome do autor. Nesse sentido, a escrita histórica permanece controlada pelas práticas das quais resulta bem mais que isto, ela própria é uma prática social que confere ao leitor um lugar bem, determinado. Assim, a construção historiográfica a partir de um lugar social, conseqüentemente, a pesquisa, tem por base os documentos e as questões propostas organizadas e submetidas as imposições ligadas aos privilégios e suas particularidades. Sendo assim, é a partir desse lugar que se determinam os limites e os métodos de pesquisa a fim de atender os verdadeiros interesses. Entretanto, a produção historiográfica é partilhada entre a escrita e o conhecimento científico do pesquisador. Além disso, é fundamental a neutralidade do pesquisador.
O discurso assume uma posição neutra, uma forma de transformar-se na maneira de defender o lugar. O não-dito é ao mesmo tempo o inconfessado dos textos que se tornaram pretextos, a exterioridade daquilo que se faz com relação àquilo que se diz, e a eliminação de um lugar ou de uma força que se articula numa linguagem.
O autor enfatiza que o lugar é determinante para se escrever sobre ele, uma vez que o historiador para escrever a história precisa saber como funciona essa sociedade. Por isso, a natureza e a cultura são de fato fundamentais para a pesquisa. A operação historiográfica fabrica o historiador. Todo trabalho científico opera uma redistribuição do espaço e o estabelecimento das fontes através de uma ação instaurada por técnicas de transformação.
Portanto, entendemos que, os procedimentos teóricos-metodológicos necessários para a elaboração de uma análise historiográfica dependem das técnicas atuais utilizadas levando o historiador a separar o que é imprescindível para o seu trabalho e para construção dos objetos da pesquisa e acumulação dos dados. Destacamos ainda que as particularidades existentes, a mutação do sentido ou do real na produção historiográfica ou dos desvios significativos, a posição do particular como limite do pensamento e a composição de um lugar que instaura no presente a figura do passado e do presente e suas ambivalências. A prática se constitui no próprio momento investigativo e os procedimentos teórico-metodológicos são utilizados pelo historiador no momento dessa prática transformando a natureza em cultura, o dado no criado. E a escrita histórica se compõe em um conjunto coerente de dados, permanecendo influenciada pelas práticas sociais, assim, cria o passado. Entretanto, essa escrita também pode enterrar o passado, no sentido de que a linguagem tem a função de reconstrução. Essa linguagem permite a prática de situar-se em relação ao seu outro, o passado e a historiografia efetua uma nova distribuição de práticas sistematizadas tendo no discurso histórico uma representação escriturária privilegiada da prática e das relações sociais.
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