quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

TERRA E POPULAÇÃO

LEWIN, Linda Política e parentela na Paraíba. Rio de Janeiro: Record, 1993. pp.33-69.

TERRA E POPULAÇÃO

O presente estudo sobre terra e população no âmbito da Paraíba segundo Linda Lewin, inicialmente anuncia no contexto agrário e regional onde a Paraíba está localizada, moldada nos aspectos geográficos como a topografia, as questões climáticas e assim, esses padrões da região como característica geográfica vistos como fatores negativos para o desenvolvimento econômico da região.
Percebemos que a população interiorana não se volta para os centros comerciais e administrativos do país no litoral, mas principalmente para o interior da região. Podemos dizer que as barreiras naturais juntamente como às limitações impostas pela Coroa e o declínio na produção de açúcar para o mercado mundial possibilitou a superação do centro-sul do país sobre a Paraíba, haja vista o crescimento econômico alcançado, devido aos esforços políticos desenvolvidos em prol do centro-sul.
Assim, a região açucareira mais rica do país vai se curvar a ascensão do café, na época da independência. O fato da ausência de uma imigração significativa para o nordeste contribuiu para que a região centro-sul evoluísse de forma considerável. O nordeste manteve ao longo dos anos uma população homogênea durante a República Velha, em uma época em que as características tradicionais estavam sendo modificadas devido a chegada dos imigrantes e da industrialização.
Daí, a região nordeste ficar subordinada economicamente a São Paulo e Rio de Janeiro mesmo sendo exportadora de matéria-prima como o algodão. Assim, o centro-sul torna-se o principal comprador do açúcar, além disso, o nordeste passa a ser responsável pela exportação de mão-de-obra barata nas profissões de baixa remuneração para o centro-sul.
Vale ressaltar que a geografia humana e física explica porque o subdesenvolvimento persistiu na região nordeste. Não podemos esquecer dos acidentes geográficos que privaram a Paraíba de uma ampla zona açucareira e concederam a Pernambuco o papel de um dos centros açucareiros mais produtivos do país. Essa Geografia regional apresenta desde o início Pernambuco como uma zona propícia ao cultivo do açúcar e sua posição geográfica como entreposto para o comércio internacional. Até o final do século XVIII, a geografia tinha definido apenas duas zonas para habitação da Paraíba, o litoral e o interior. Mas devido as divisões zonais surgem os eixos verticais norte-sul, estas ignoram as fronteiras políticas estabelecidas durante a colônia. Esse fato permitiu Pernambuco controlar a Paraíba durante séculos, porque a topografia a integrava ao seu território. Além do que Pernambuco tinha uma baia que fizera com que os primeiros colonizadores ali estabelecessem a capital administrativa da região.
Na realidade, os aspectos geográficos privaram a Paraíba de uma ampla zona açucareira e concederam a Pernambuco. Em meados dos séculos XIX, a divisão entre o litoral e o sertão fora substituída por cinco zonas geográficas, cada qual com sua especialização econômica com exceção da zona litorânea.
Podemos ainda dizer que em relação a vegetação da caatinga, essa superfície de terra mais seca que circundava o agreste, desenvolvera como uma zona pecuária acessória para a faixa litorânea açucareira. A agricultura, os cereais, o algodão começou a roubar os recursos dos forrageiros da economia pecuária. O algodão fez de Campina Grande “o portão de entrada para o sertão” Graças ao algodão, os políticos da caatinga-agreste fazem alianças com os chefes políticos locais.
Enquanto o brejo foi uma zona intermediária, o sertão do cariri com condições para o cultivo do algodão, também em sua geografia determinou que o cariri e o alto sertão permanecessem comercializando integrados com os estados vizinhos e separados da capital litorânea da Paraíba. Em relação à seca podemos afirmar que sempre foi um dos dilemas do povo nordestino e desculpas para os políticos angariar fundos para investimentos que nem sempre são realizados.
Por ser o clima uma variável, as secas periódicas exercem influência decisiva sobre a evolução da economia política. Por isso, a seca causou a emigração e afetou todas as classes sociais, os mais pobres eram geralmente os primeiros a tomar iniciativa de buscar um novo emprego ou de procurar o caminho dos retirantes. A miséria em massa induzida pela seca teve conseqüências para as famílias da elite paraibana. A seca coloca a prova a solidariedade entre as famílias de elite e revelava a capacidade de uma parentela principal no sentido de canalizar recursos para além de seu próprio município.
A política da seca refere-se à posição que o nordeste ocupa no conjunto da nação. A própria seca tornou-se uma questão política. A fome generalizada e a desolação econômica revelaram também a influência declinante da região na política nacional. A seca marcou dramaticamente a história do subdesenvolvimento da região nordestina conseqüentemente o crescimento dinâmico do eixo industrializante de São Paulo e Rio de Janeiro.
Entretanto, os padrões históricos da conquista e do povoamento da Paraíba continuaram a moldar os aspectos geográficos e climáticos da região, permaneceram moldando a economia política da Paraíba. O povoado situado nas terras continentais na região em proximidades da desembocadura do rio Paraíba criou as condições para que as relações comerciais nos séculos XIX e XX fossem perturbadas pela tensão econômica.
Durante o século XIX, os poderosos comerciantes de Pernambuco controlavam o comércio costeiro da região até o sul do Maranhão, agindo monopolizando o comércio da capital paraibana em Varadouro conseqüentemente evitou o desenvolvimento de Cabedelo como um porto de águas profundas. Assim, os comerciantes paraibanos permanecem subordinados as casas de comércio exportador-importador de Pernambuco e a dominação política regional de Recife.
O exercício do poder permaneceu ligado ao fato de que os primeiros povoadores que desbravaram e povoaram tanto o litoral como o interior realizou com empreendimentos militares e familiares. A economia política que eles legaram aos seus descendentes continuou a refletir a alta dependência com relação à filiação familiar e aos laços de parentesco, apesar da mudança rural sem precedentes que se operou depois de 1800.
Desse legado da fronteira tiveram importantes conseqüências primeiro: a resolução dos conflitos por meio de lutas violentas e endêmicas entre as famílias, segundo, a importância assumida pela linhagem como base para a reivindicação ao direito à autoridade política. Em terceiro, a participação na família como fundamento dos direitos da terra. Portanto, a legitimidade política da oligarquia no nível local viabilizou-se também a preservação da violência como um meio socialmente aceito para resolução dos conflitos.
Sem esquecer destacamos historicamente a guerra brutal e genocida que foi desenvolvida contra a população indígena e os conquistadores do sertão nordestino no século XVII e XVIII que serviu para perpetuar os padrões de violência marcantes nos ataques e nas incursões de duas culturas semi-nômades, os ibéricos e os nativos cariris, isto é, a guerra ficou ligada a fusão das raças.
Lamentavelmente o poder do governo central era exercido esporadicamente, as famílias colonizadoras disputavam impunemente entre si a terra e os direitos de pastagem. Além disso, eram comuns as hostilidades armadas reclamando do Estado o reconhecimento de suas pretensões pelos cargos militares e administrativos locais.
Na realidade era a posse da terra, combinada com uma linhagem de prestígio, o que conferia o direito ao domínio local. Os direitos legais a terra assentava numa tradição oral informal que ligava os proprietários, legítimos as grandes concessões de terra, as sesmarias, que as primeiras famílias do sertão tinham obtido da Coroa. A política da Coroa era conceder terras apenas aos chefes ou irmãos freqüentemente a conjunto de irmãos. Os Oliveira Ledo, por exemplo, como unidade familiar, receberam sua primeira concessão de 4.000 km².
Outrossim, podemos afirmar que durante o século XIX na Paraíba ocorreu um deslocamento sem precedentes da população para o interior, testemunhando as transformações econômicas em curso, no sentido de reorganização da economia política da Paraíba no final do Império. O crescimento da produção agrária possibilitou o aumento populacional urbano do interior. Esse dinâmico povoamento no interior da Paraíba permaneceu marcado pela expansão de cereais e algodão. O crescimento urbano no interior foi a segunda mudança demográfica principal na economia política paraibana do século XIX. Por isso, o surgimento de novos núcleos de povoamento e a expansão dos já existentes testemunhou a revolução urbana que ocorreu nas zonas situadas para além do litoral.
Nesse contexto, subjacente a esse novo papel dinâmico ocorrido no interior, a economia paraibana estava desenvolvendo o intercâmbio do gado, do couro e do algodão de fibras longas do sertão, pelos gêneros alimentícios do brejo e da caatinga-agreste. As raízes da revolução urbana em pequena escala que se manifestou no interior da Paraíba por volta da década de 1850 remonta os anos de 1770 e 1780 quando um novo produto o algodão desponta com grande impacto numa região para além do litoral.
Vale destacar aqui o interesse dos britânicos pelo algodão do nordeste especialmente no interior de pernambucano-paraibano e no Maranhão, isto é, na exportação direta de algodão cru da Paraíba datado de 1819. Os ingleses mudaram-se de Recife para Varadouro na Paraíba. O tempo de avanço econômico também enfrentou a concorrência americana o que resultou numa queda violenta das exportações de algodão. Mas após 1889 surgiram novos fatores de demanda interna e externa para o algodão cru da Paraíba.
É importante destacar que o significado político da identidade do Nordeste como uma zona de produção de algodão cru para o mercado mundial repousa na transformação que o novo produto de exportação impôs aos padrões de trabalho e de uso da terra no período da República Velha.
A posse da terra foi sempre uma questão resolvida sempre através de tramóia jurídica ou conflitos armados. Logo que a agricultura passou a competir com a criação de gado pela utilização dos pastos, conflitos armados sobre o uso da terra passaram a ocorrer com freqüência. Os novos incentivos econômicos após 1860 para a produção do algodão e cereais nas zonas de policultura aumentaram o valor das terras. O desmatamento extensivo, por volta de 1907, registrou o avanço da agricultura. No entanto, é impossível determinar com exatidão o impacto da expansão do algodão sobre os padrões de posse da terra na Paraíba.
Já a organização política local da oligarquia na Paraíba refletia diretamente o padrão de propriedade da terra. Os novos padrões de uso da terra que refletiam o deslocamento demográfico para o interior, e uma concentração crescente da sua propriedade conduziram ao aparecimento de um novo campesinato na década de 1870. Os arranjos de trabalho entre proprietários e moradores que se seguiram a baixa do algodão e a revolta de Quebra Quilos respondem pelo controle político em grande medida indisputado que os proprietários na oligarquia exerceram sobre seus clientes rurais até os anos de 1920.
Geralmente os grandes proprietários de terras subcontratavam sua produção de algodão, cedendo ocasionalmente áreas cercadas para moradores ou pequenos proprietários de terras independentes. Portanto, ao longo da República Velha foi desenvolvido um controle vertical surpreendente em toda parte do país pelas oligarquias agrárias fundamentada nas relações que mantinham com os moradores, uma vez que representavam a maioria da população do país. Os padrões de distribuição da terra, do trabalho e da população, juntamente com a comercialização da produção rural depois de 1880, afetaram diretamente o curso da política oligárquica paraibana. Apesar das condições de crescimento rápido quase ininterrupto durante a República Velha, é sempre necessário levar em conta uma verdade fundamental da política paraibana a economia agrária continuava a se constituir numa economia de extrema escassez inclusive para os grupos de base familiar. O crescimento econômico favoreceu apenas uma estreita faixa da população.

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