sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

IDEOLOGIAS

IDEOLOGIAS



Ao pensar sobre o problema de determinar um conceito para ideologia percebe-se que é difícil, devido a sua complexidade, uma vez que envolve aspectos contraditórios, paradoxos e arbitrários, além de ambigüidades, de equívocos formados resultado de mal-entendimentos, o que justifica essa dificuldade. Dessa forma, é preciso acrescentar que o conceito de ideologia não tem sua origem em Marx, mas, representa o estudo científico das idéias e essas são resultados da interação entre os vários organismos que sejam políticos, econômico ou social.
Conforme Löwy (1989), em Marx ideologia é um conceito pejorativo, um conceito crítico que implica ilusão, ou se refere à consciência deformada realidade que se dá através da ideologia dominante: as idéias das classes dominantes são as ideologias dominantes na sociedade. No entanto, esse conceito continua sua trajetória no marxismo posterior a Marx, sobretudo na obra de Lênin, que considerou ideologia como qualquer concepção da realidade social ou política vinculada as classes sociais.
Sendo assim, ideologia é uma palavra que vai mudando de sentido passando de uma corrente intelectual para outras, de uma corrente de idéias para outras. E no seio de uma mesma corrente de idéias como o marxismo. Entre Marx e Lênin percebe-se uma imensa diferença. Por isso, pode-se dizer que não existe uma única fonte de marxismo, mas vários marxismos, várias correntes ideológicas de pensamento.
Para Mannheim, ideologia é o conjunto das concepções, idéias, representações, teorias, que orientam para a estabilização ou legitimação, ou reprodução, da ordem estabelecida. Assume também uma dimensão crítica ou de negação da ordem social existente e se orientam para sua ruptura. Desse modo, ideologia em Mannhein, adquire dois significados: ideologia total consiste no conjunto de pensamentos vinculados aos interesses, às posições sociais de grupos e classes. Entretanto, ideologia no sentido restrito significa uma forma conservadora em oposição à forma crítica, que ele considera utopia.
Assim, as visões ideológicas de mundo podem servir para legitimar, justificar, defender ou manter a ordem social. Em relação a uma visão social utópica refere-se a uma função crítica, negativa subversiva quando apontar para uma realidade não existente. Para entender os processos de transformação ideológica ou de transformações sociais do mundo, é necessário perceber o que acontece na história social e econômica, assim, a história nos dá a chave para compreender essas transformações profundas que se deram na história, na ideologia, na utopia, seja religiosa, política ou filosófica ou mesmo da ciência social, econômica ou política.
Na sociologia funcionalista, as ideologias são vistas como valores consensuais. Uma análise dialética das ideologias ou das visões de mundo, elas são contraditórias, que existe um enfrentamento permanente entre as ideologias e as utopias na sociedade. Não existe consenso total, nem tão pouco uma ideologia dominante, existe enfrentamentos ideológicos e contradições entre ideologias, utopias ou visões de mundo conflitantes e contraditórias.
É importante compreender que Marx e Hegel se diferenciam no sentido de que a dialética de Hegel é um método de reconciliação com a realidade. Para Hegel, o papel da filosofia dialética é de explicar, descrever e legitimar a realidade existente como racional, por isso se diz: tudo que é real é racional. O problema para Marx não está em interpretar a realidade, mas transformá-la. O marxismo não é uma teoria científica, uma vez que visa uma transformação radical da realidade. Compreender a realidade para transformá-la a partir de um ponto de vista de classe, e das classes dominantes. É ai que se encontra o divisor de águas entre Marx e Hegel,é a dimensão revolucionária da dialética marxiana contra a posição de caráter conservador e legitimador do status quo da dialética hegeliana.
Para explicar de maneira mais concreta o problema da relação entre ideologia e prática social ou prática política, a contribuição do método dialético, ou da filosofia da práxis de Marx, é interessante confrontar com as formas de pensamento dominante da época. As teorias dos enciclopedistas em relação as idéias, as ideologias, as concepções do mundo, como produto das circunstâncias sociais em que vivem os homens. São as circunstâncias materiais que produzem a consciência, as idéias ou a ideologias.
Para os neo-hegelianos de esquerda, o importante era o espírito e a luta para mudar a sociedade, era uma luta espiritual, uma luta crítica. Por isso, Marx chamava de críticos críticos. Eles acreditavam que criticando as idéias erradas, transformando a consciência, ou a ideologia, ou o pensamento dos homens, transformariam a sociedade. Marx rompe radicalmente com aquele círculo vicioso e apresenta uma nova concepção na qual a transformação das idéias, das ideologias, da consciência social, coincide com a transformação da própria sociedade, em um processo que é o da prática revolucionária das classes dominadas.
No que se refere ao positivismo pode-se inicialmente considerar que as três principais proposições teórico-metodológicas sobre o relacionamento entre ideologias, utopias, visões sociais de mundo, valores, posições de classe, posições políticas, de um lado e do outro o processo do conhecimento científico: do positivismo, o historicismo e marxismo. Pode ocorrer o cruzamento entre essas linhas de pensamentos.
As idéias do positivismo remete a hipótese de que a sociedade humana é regulada por leis naturais, ou por leis que têm todas as características das leis naturais. Assim, dessa hispótese conclui-se que os métodos e procedimentos para conhecer a sociedade são exatamente os mesmos utilizados para conhecer a natureza. A metodologia das ciências naturais de ser idêntica a metodologia das ciências sociais. O naturalismo positivista é uma maneira totalmente lógica, se a sociedade é regida por leis de tipo natural, a ciência que estuda essas leis naturais da sociedade é do mesmo tipo que a ciência que estuda as leis da autonomia, da biologia, etc.
Além disso, da mesma maneira que as ciências naturais são objetivas, neutras, livres de juízo de valor, de ideologias políticas, sociais ou outras, as ciências sociais devem funcionar exatamente segundo esse modelo de objetividade científica. O cientista social deve estudar a sociedade com o mesmo espírito objetivo, neutro, livre de juízo de valor, livre de qualquer ideologias ou visões de mundo.
O princípio do positivismo aparece como uma visão social do mundo, como uma concepção da ciência social que tem um aspecto utópico-crítico muito importante. O positivismo tende a consolidar a ordem pública pelo desenvolvimento e resignação criando uma disposição que se aplica a todos os campos da sociedade.
Para Durkheim, o sociólogo deve se rodear de todas as precauções possíveis contra sugestões irracionais, além disso, pôr de lado sistematicamente todas as prenoções antes de começar a estudar a realidade social, haja vista que seriam viseiras que impediriam de ver o que realmente estaria se passando. A objetividade do método positivista significa que o sociólogo, que está alienado em sua ideologia, de visão de mundo, de seus valores, de suas prenoções de classe, consegue vencer esse obstáculo e atingir a objetividade científica. No entanto é difícil sair desse impasse ideológico. Observa-se que nunca se haverá um conhecimento objetivo da realidade se o cientista social desde o princípio parte da idéia de que o que ele está buscando não é o conhecimento da realidade, mas uma outra coisa, talvez seja a propaganda ou a publicidade. O objetivo dele não era conhecer a verdade, mas fazer propaganda.
Assim, considerando que a realidade é um conjunto infinito, para se realizar uma investigação, para fazer ciência, é preciso trabalhar com dados finitos, relacioná-la a um objeto limitado.Toda ciência histórica e social implica necessariamente certos valores, que vão apontar o que é importante o que é não é, o que merece ser estudado e o que não merece. São esses valores que nos permitem colher nessa massa infinita de pequenos fatos (ou grandes, ou médios), aqueles que devem ser considerados importantes.
Nesse sentido, o importante é que esses valores vão fornecer a problemática, ou seja, irá possibilitar interrogar a realidade. Max Weber considera que essas idéias de valor que orientam a pesquisa são limitadas. Por isso, ainda afirma Weber é lamentável a influência do método biológico, positivista, naturalista, sobretudo na ciência econômica, na economia política. Tanto socialistas como historiadores já criticam essa ilusão de que os valores podem desaparecer, que a ciência econômica possa ser neutra, livre de qualquer ponto de vista axiológico.
Segundo Löwy, Max Weber considera que a ciência social não apenas pode como deve ser livre de juízos de valor. Ele considera que logo definido o objeto de estudo, o processo de investigação empírica que será desenvolvido está submetido a regras objetivas e universais da ciência, não dependem de valores. Os instrumentos conceituais usados dependem de valores, mas a maneira de usá-los para chegar à verdade se relaciona a regras gerais universais, que valem para qualquer investigação. Além disso, enfatiza-se que a análise dos fatos não conduz, de maneira lógica a nenhuma conclusão política ou moral. Não vínculo lógico-dedutivo entre a análise fatual e a análise político-moral. Assim, os valores morais não podem se reconciliar a partir de raciocínios científicos. Por outro lado, o tipo ideal é um instrumento para estudar a realidade. Sua construção do tipo ideal se faz a partir de uma relação a valores, é a relação a valores que vai fornecer os critérios, a motivação para a construção do tipo ideal.
O marxismo se baseia nas questões de classe social e do conhecimento científico estes dois pontos de vista, não são contraditórios. E o conceito de representação científica de classe mostra que Marx não via uma incompatibilidade total entre os dois. A caracterização de uma teoria como representando o ponto de vista de uma classe determinante não significa que essa obra não tenha valor científico.
Ao refletir sobre o pensamento marxista considerando a visão dos economistas que critica os fundamentos do capitalismo, uma vez que o progresso do capitalismo produz necessariamente a pobreza, o desemprego, a desigualdade social, exploração e crise de existência. E ainda acrescenta, o capitalismo traz sempre crises econômicas que agrava a miséria do povo, que o desenvolvimento do capitalismo leva à expropriação dos camponeses e dos artesãos, que são condenados à miséria.
O marxismo critica o progresso advindo do capitalismo haja vista as crises no âmbito rural e urbano que agravaram as condições de vida da população menos favorecida. Assim, a classe que representa o progresso, a burguesia industrial. O problema do pensamento proletário que os economista destacam representam várias etapas do pensamento burguês. E Marx considera que da mesma forma que os economistas são os representantes científicos da classe burguesa, os socialistas e os comunistas são os teóricos da classe proletária. O socialismo como ciência, como teoria científica, só aparece no momento em que aparece a luta de classes, o proletariado. De maneira nenhuma Marx pretende que sua crítica da economia política seja neutra, pura, objetiva, imparcial, desvincula-a de qualquer ponto de vista de classe. O que Marx defende é um ponto de vista vinculado a uma classe social determinada. Assim, Marx se considera o representante oficial do proletariado.
O proletariado é o conjunto daqueles que vivem da venda de sua força de trabalho, isso inclui não só a classe operária industrial, como uma série de camadas que tradicionalmente eram de origem pequeno-burguesa (ou de classe média) mas que estão conhecendo um processo de proletarização. Enquanto os intelectuais não são uma classe. O que define o intelectual não é a sua posição social de classe, é o caráter de seu trabalho, a sua formação cultural.
O que se destaca no movimento marxista são as divergências que aparecem no seio do movimento, do proletariado, do socialista, são também produtos naturais do processo de conhecimento e de luta. É inevitável aparecer pontos de vista diferentes, mas não há ciência, não há progresso no conhecimento, não há práticas política, sem divergências. Desde que se coloque uma tentativa de conhecer a realidade, uma tentativa de agir sobre a realidade, vão aparecer pontos de vistas diferentes, e não se trata apenas de uma divergência resultante de influência da burguesia, ou da burocracia. As divergências fazem parte do processo da teoria e da prática, também da dialética entre teoria e prática.
O que caracteriza o conhecimento científico e o que define a ciência com tal é a tentativa de conhecimento da verdade. Nesse sentido, há uma relação entre ciência e conhecimento da verdade. Porém, a verdade absoluta jamais será conhecida, todo o processo de conhecimento é um processo de acercamento, de aproximação à verdade. Dentro do conhecimento científico há níveis maiores ou menores da aproximação da verdade.
Portanto, uma ideologia nacionalista, populista, conservadora, enfim, todas as modalidades da ideologia burguesa podem estar presentes na consciência empírica. Assim, os marxistas defendem a idéia de que por mais que os proletários tenham a sua opinião, essa consciência de classe imputada, pode chegar a uma conjuntura histórica determinada.

LÖWY, Michel Ideologias e ciência social: elementos para uma análise marxista – São Paulo: Cortez, 1989.

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