quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

EDUCAÇÃO E O PAPEL DA SUPERVISÃO

O CONTEXTO DA PRÁTICA EDUCATIVA



Nas análises feitas no contexto da prática educativa, destacamos alguns aspectos básicos de observações, sempre levando em conta os espaços das salas de aula. Ao analisarmos as condições de ensino-aprendizagem das salas de aula observadas percebemos que a metodologia preferencial das professoras é basicamente formada de aulas expositivas, com ênfase na transmissão verbal e no uso do quadro de giz. Em geral, boa parte da aula é usada com atividades no quadro negro que costumam ser demoradas, visto que as crianças primeiro copiam e depois tentam resolver, nem sempre conseguindo ir até o final. As crianças com necessidades especiais de educação observadas apresentam, dentro da sala de aula, praticamente o mesmo comportamento dos demais alunos, podendo, além das dificuldades de aprendizagem, apresentarem também comportamentos comuns aos outros alunos, que necessariamente não se constituem como características intrínsecas à dificuldade ou deficiência apresentada tais como: timidez, indisciplina, falta de atenção, desinteresse etc. Os conteúdos trabalhados em sala de aula enfatizam basicamente as atividades referentes aos livros adotados oficialmente pela escola e, nas atividades de raciocínio lógico-matemático, predominam exercícios de iniciação ao cálculo das quatro operações sempre trabalhados através de continhas e problemas expostos no quadro.
Dentro das observações feitas na sala de aula, foi possível constatar que as atividades desenvolvidas ainda estão longe de se aproximarem da real necessidade de apropriação do saber sistematizado. Observamos que a postura do professor na sala de aula, via de regra, não é crítica. Não possui uma atitude de investigação voltada para o aumento ou descoberta do conhecimento científico, não consegue fazer com que o conhecimento se torne instrumento de soluções de problemas, não dá condições ao aluno de problematizar o próprio conhecimento diante da realidade. Essa problematização, como postura pedagógica, é necessária para que se possa reconstruir criticamente o conhecimento, dentro de um contexto histórico. Na maioria das salas observadas, as atividades em grupo dificilmente eram desenvolvidas ou, quando muito, os alunos organizavam-se em grupos onde os trabalhos acabavam por acontecer individualmente. As professoras parecem não acreditar no trabalho de grupo como um recurso facilitador da aprendizagem, onde a interação e diferença de níveis podem contribuir significativamente, para o desenvolvimento das funções cognitivas. Essa estratégia de trabalho favoreceria as crianças.
Observamos que, no geral, as crianças integram sem maiores problemas tanto na sala de aula quanto na escola. Estudam, brincam, correm, e brigam como os demais. Ou seja, independente das suas dificuldades, usufruem o mesmo contexto escolar de todos os alunos, com todas as vantagens, fragilidades e limitações pedagógicas pertinentes ao processo escolar. Todas essas reflexões ganham peso e maior importância quando nos referimos às crianças com problemas de aprendizagem ou com algum tipo de limitação sensorial, física ou mental. Essas crianças, em especial, precisarão de professores que creiam nas suas capacidades de aprendizagem por mais limitadas que elas sejam, que acreditem que a escola existe para servi-las e que deve se adaptar as suas necessidades, propondo atividades que favoreçam o seu desenvolvimento. Professores que vejam nas dificuldades dos alunos possibilidades de desafios profissionais, onde a partir desses desafios eles poderão enriquecer a sua prática.
Em relação às observações feitas na sala de aula ainda percebemos a preocupação das professoras em desenvolver atividades que envolvam sempre letras, sílabas e palavras. As atividades eram feitas ora em pequenos grupos, ora individualmente. Alguns jogos e materiais pedagógicos usados poderiam ser mais bem explorados e ir além das atividades que elas planejavam. Podemos considerar que as professoras das duas salas observadas demonstravam um grande envolvimento com o trabalho. Mostraram-se interessadas pelos alunos, conhecem suas histórias de vida, mantém, na medida do possível, contato freqüente com a família das crianças. É possível dizer que elas desenvolvem um importante vínculo afetivo com as crianças, e que esse fator, de alguma forma contribui para a melhoria do processo de aprendizagem. Pudemos constatar, através das falas tanto das professoras da sala de aula, como das professoras das salas de outras séries, que quase a totalidade dos alunos atendidos apresentam alguma melhora na sua aprendizagem, especialmente aqueles que não trazem nenhuma deficiência neurológica.
Elas destacam inclusive que as crianças melhoram não só no rendimento escolar como também no comportamento e disciplina. Quanto a essas melhoras, as professoras das salas de aula costumam atribuir o êxito dos alunos muito mais as condições favoráveis de trabalho do que as qualidades pessoais da professora da sala de apoio. Buscando analisar os fatores que proporcionam a aprendizagem das crianças atendidas pela sala de apoio, destacamos alguns aspectos (maior proximidade com a criança, material pedagógico diversificado, número de crianças atendidas, dentre outros), que se relacionam muito mais à organização e condições de trabalho pedagógico realizado na sala de apoio do que a métodos e conteúdos diferenciados. De certa forma, a melhoria na aprendizagem dessas crianças, deveria levar a escola a uma reflexão crítica e profunda sobre quais os fatores que contribuíram para a sua não aprendizagem dentro da sala de aula. Na verdade, o êxito observado em algumas situações de aprendizagem na sala de apoio, não deve se constituir um privilégio dessa sala ou da professora da sala, visto que constatamos que os procedimentos pedagógicos trabalhados seriam perfeitamente possíveis e passíveis de acontecer dentro da sala de aula regular, executados pela professora da sala de aula regular. Da mesma forma, constatamos ainda que, em algumas situações, a professora mostrou-se limitada ou impossibilitada de atender as necessidades pedagógicas de alguns alunos exatamente porque em determinados momentos não buscou recursos e práticas significativas de intervenções pedagógicas. As crianças dentro da escola não se adaptam a ela, tanto podem ter essa oportunidade de interagir com o saber, como também, poderão aumentar substancialmente a parcela de excluídos sociais, se a escola não lhes possibilitar a oportunidade de saberes significativos através de uma intervenção pedagógica conseqüente, adequada e de qualidade.
A visão das supervisoras
Como você vê a intervenção do supervisor na escola? Vejamos suas falas: (...) eu acho que é um trabalho bom porque ajuda a criança a se desenvolver, porque eu acho que eles querem sempre imitar.Eu acho que essa proposta deveria ser implantada em todas as escolas.
Nas observações feitas na prática, essas posições, às vezes, se mostram contraditórias, quando, no dia a dia da escola, as supervisoras e professoras estão sempre colocando em destaque os aspectos mais difíceis para se trabalhar com essas crianças. É interessante notar que todas as supervisoras questionadas concordam que deve haver intervenção profissional. No entanto, no dia a dia elas se queixam da diferença de níveis encontrados em suas salas de aula, achando que o ideal seria trabalhar com uma sala de aula homogênea, onde todas as crianças apresentassem o mesmo nível de desenvolvimento. Percebemos que, via de regra, os profissonais não vêem a heterogeneidade como um fator de maiores possibilidades de aprendizagem, de trocas significativas, que proporciona, à criança, o contato com os diversos tipos de saberes e culturas. Ao contrário delas, acreditamos que, a partir de trocas diferenciadas e significativas, a criança ampliará suas chances de se apropriar com mais qualidade do saber sistematizado. Sobre esse assunto, concordamos com Boneti (1999, p. 2) quando diz que:
A prática pedagogia não só aceita, mas valoriza a diferença porque entende que é na diferença que crescemos, nos afirmamos e nos constituímos como sujeitos. Na pedagogia da inclusão, a aprendizagem cooperativa emerge em detrimento a competição, porque se privilegia o espaço coletivo da aprendizagem.

Algumas supervisoras enfatizaram a necessidade da participação mais compreensão efetiva da professora por uma questão social entendendo que não deve ser cobrado do aluno um rendimento maior em relação a conteúdo, argumentando que, para a criança com dificuldades ou deficiências ter rendimento na aprendizagem, ela também teria que ser melhor preparada para trabalhar com elas. Para elas, é improvável que a escola possa proporcionar avanços cognitivos nos alunos com necessidades educativas especiais. Sobre isso, concordamos com Vygotsky (1196, p. 237) quando diz que:
A cultura e o meio ambiente refazem uma pessoa não apenas por lhe oferecer determinado conhecimento, mas pela transformação da própria estrutura de seus processos psicológicos, pelo desenvolvimento nela de determinadas técnicas para usar suas próprias capacidades.

Outro aspecto observado foi a necessidade demonstrada pelo professor de participar de cursos que lhes assegurem conteúdos voltados para a continuidade dos estudos, de novos cursos conhecimentos, bem como, métodos e técnicas específicas para a aprendizagem escolar desses alunos com problemas de aprendizagens.. De certa forma, essa postura os distancia da adequada preparação para o trabalho com a diferença e a diversidade que passa pela compreensão de fundamentos e conhecimentos científicos dos problemas pedagógicos.
Constatamos que mesmo dizendo acreditarem e defenderem a qualidade do ensino os profissionais ainda têm um discurso pessimista em relação ao seu próprio trabalho na sala de aula com o aluno que apresenta deficiência ou dificuldades de aprendizagem. Para as duas supervisoras da escola, a qualidade é vista como uma coisa importante e positiva para o aluno. Para elas, essa visão se consolidou a partir do trabalho em sala, pela oportunidade que tem de conviver e atender às crianças, como também de discutir, estudar e fazer cursos na área de educação. Isso fica claro na seguinte fala:
Antes desse trabalho eu não acreditava muito não, até porque eu não conhecia, mas agora, depois dos cursos e de toda essa experiência com a sala de aula, eu acredito e vejo que é melhor para o aluno, ele aprende mais convivendo com a ajuda contínua dos profissionais da escola. Vejo como uma coisa muito positiva.

Elas acham também que as professoras precisam de um maior suporte para desenvolver um trabalho com mais competência questionando a formação, a qualidade da intervenção pedagógica desenvolvida com o aluno. Talvez a professora em destaque tenha levantado essas questões por perceber que a qualidade no ensino não acontece só pelo fato da escola ter aberto as suas portas. Entende-se que a prática deve estar lhe mostrando que, para que esse processo seja bem sucedido, é necessário uma mudança de paradigmas envolvendo a todos os profissionais que fazem a escola.
Em relação aos diretores entrevistados, constatamos que um deles se mostrou mais favorável que o outro que insistia em destacar sempre as dificuldades encontradas nesse processo. Esse diretor parece estar mais preocupada com os problemas de comportamento que esses alunos possam vir a ter na escola. Pelo seu depoimento, é possível perceber que na sua visão, o aluno que tem problemas de aprendizagem dá mais trabalho as professoras e se torna mais difícil. Vygotsky (1989), em seus estudos sobre defectologia, diz que a escola tem como dever não só adaptar-se e preparar-se para atender as deficiências das crianças, mas sobretudo lutar contra elas e supera-las. Numa escola, é preciso rever os papéis dos diretores, supervisores e coordenadores, deixando eles de serem meros burocratas, fiscalizadores, para serem líderes pedagógicos, que estejam sempre perto dos professores, orientando e participando do dia a dia das salas de aulas.
As falas das entrevistas indicaram a necessidade que a escola sente de buscar uma maior capacitação para o professor. Percebemos que, mesmo se colocando a favor da qualidade no ensino, a escola ainda sente necessidade de contar com uma educação "especial" para atender as crianças com necessidades educativas especiais. Os relatos demonstraram ainda existir, por parte dos educadores, muitos questionamentos, restrições, mitos e crenças quanto à inserção e escolarização de alunos com problemas de aprendizagem. Depreende-se, ainda, que o êxito do ensino depende sobretudo de mudanças na prática pedagógica do professor.
CONTRIBUIÇÕES DO SUPERVISOR EM SALA DE AULA: APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO DOS ALUNOS


Percebe-se que as contribuições do supervisor em sala de aula é um apoio fundamental para a educação. Elas foram unânimes em destacar o seu papel, sendo apontada em determinadas falas como a “redentora” da aprendizagem dos alunos que não conseguem acompanhar os conteúdos trabalhados dentro da sala de aula. Elas também destacam as condições materiais oferecidas pela escola e a possibilidade de se fazer um trabalho melhor pelo fato das professoras da sala trabalharem com um número reduzido de alunos, em cada atendimento. Percebe-se que elas acham que o trabalho do supervisor proporciona maiores possibilidades de se conseguir resultados devido as melhores condições de material e de trabalho.
Isso reforça a necessidade que as professoras sentem de buscar soluções fora da sala de aula e em outros profissionais, como também do desejo de se apropriarem de métodos e técnicas que elas acreditam que sejam diferenciados para esse trabalho. A esse respeito, Giné e Ruiz (in Coll, Palacios e Marchesi, 1995, p.304) nos diz que o professor que trabalha com crianças com necessidades educativas especiais deve
preparar diferentes materiais; organizar a classe de forma que seja possível aprender com diferentes ritmos e de diferentes maneiras, predispondo-se a flexibilizar seu tratamento com os alunos e a captar a melhor maneira de comunicar-se com cada um deles, para ajustar e modificar sua intervenção facilitadora da aprendizagem e do crescimento pessoal.
Entendemos que deve existir por parte do professor, essa possibilidade de adequações na classe, visando conhecer as relações entre as condições de sua sala de aula e a sua intervenção, assim como os fatores que influenciam na aprendizagem e desenvolvimento dos alunos. Para um dos diretores os pais estão bastante satisfeitos e agradecidos pela oportunidade de colocarem seus filhos numa escola que podem de fato aprenderem. Entende-se que este é um bom argumento em defesa da escola.
Na percepção do professor do supervisor, o trabalho desenvolvido pode realmente dar grandes contribuições na aprendizagem dos alunos que apresentam dificuldades. Vêem o seu trabalho como difícil, porém, privilegiado dentro do contexto geral da escola, especialmente em relação a ação docente desenvolvida dentro da sala de aula. Consideram que as condições favoráveis e o trabalho com pequenos grupos determinantes para o progresso dos alunos. Apontam o aspecto da afetividade e proximidade com o aluno como importante no processo de aprendizagem, visto que o fato de elas trabalharem com pequenos grupos, permite-lhes dedicar "mais atenção" ao aluno e, assim, ensinar melhor. O relacionamento com a família também é destacado, sendo esses um dos fatores que ela atribui como facilitador da aprendizagem.
Outro aspecto a se considerar é o fato de que, na medida em que a professora da sala aproxima mais dos alunos, desenvolve intimidade com eles, começa a perceber também que eles não são tão incapazes quanto se pensa, que cada um tem potencialidades e possibilidades de aprendizagem. Esse aspecto leva a professora a investir na criança, até pela própria expectativa depositada nela. Diferentemente, às vezes, do professor da sala de aula, que considera o aluno com dificuldades de aprendizagens incapazes, com poucas chances de aprendizagem, resultando por não se esforçar para mudar a condição desses alunos. Podemos dizer que as condições favoráveis do trabalho desenvolvido pela equipe educacional, contribui para o desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem.
CONCLUSÃO
Verificamos que esse trabalho se constitui em um dos possíveis caminhos no processo de mudanças nos paradigmas e papel do supervisor educacional. No entanto, muito ainda há por se fazer. É necessário e urgente transformações na organização e nas condições de trabalho na escola, começando especialmente pela efetivação de programas de trabalho conjunto entre o professor e equipes pedagógica, onde as necessidades e especificidades dos alunos possam ser contempladas.
As dificuldades constatadas se apresentam muito mais pela forma como o professor organiza sua sala de aula e pela escolha dos conteúdos a serem trabalhados do que em necessidades concretas de se retirar os alunos da sala de aula para receber o mesmo tipo de atendimento noutro espaço. Sendo assim, o ensino de qualidade só será possível quando a escola for capaz de se adequar com recursos e metodologias que respondam competentemente às necessidades educacionais de todos os alunos.
Partindo dessa premissa, o papel do supervisor, deve, na medida do possível, mudar o foco de atendimento a um pequeno grupo de alunos para ser o daquele profissional voltado para todos os alunos que dele necessite. Nesse sentido, o seu trabalho estaria muito mais voltado para mudanças de estratégias pedagógicas e organização de recursos necessários para uma boa intervenção pedagógica dentro da sala de aula do que para atendimento vistos como especializados para apenas alguns alunos.
Mesmo valorizando o papel do supervisor, não podemos perder de vista que o professor regente é a figura central e mais importante no processo ensino-aprendizagem. A sala de aula, funciona, de certa forma, substituindo com algumas limitações inerentes a sua formação. Outro aspecto que não podemos deixar de destacar é que a sala de aula também colabora para a permanência na escola dos alunos que apresentam dificuldades de aprendizagem. No entanto, as mudanças ocorridas na escolas, ainda não contribuíram o suficiente para o verdadeiro processo de ensino-aprendizagem. Esse processo exige uma mudança de paradigma, que passa pela construção do projeto pedagógico da escola, a reformulação da prática pedagógica, bem como pela formação e envolvimento de todos que fazem a instituição escolar.

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