segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

O NORDESTE E OUTRAS ARATES

RESENHA ANÁLITICA ALBUQUERQUE JUNIOR, Durval Muniz de a invenção do Nordeste e outras artes IN: Geografia em ruínas. Recife: FJN Editora Massagana São Paulo: Cortez, 1999. O presente texto trata a respeito da invenção do Nordeste tendo como eixo norteador a pesquisa da Durval (1996) para doutorado em História na UNICAMP, onde este ousa colocar e buscar respostas para uma inusitada questão: a invenção do nordeste, o surgimento de um recorte espacial, de um lugar imaginário e real no mapa do Brasil. O Nordeste de Graciliano Ramos, Gilberto Freyre, João Cabral de Melo Neto, do cangaço de Lampião, da religiosidade, da seca, da miséria de uma região. Albuquerque Júnior sinaliza além do momento de emergência do Nordeste, eleva seu argumento mais longe mostrando que a produção deste lugar e de seus habitantes não pode ser explicada se nos colocarmos apenas numa perspectiva econômica e política. O autor aponta incisivamemte, da produção histórica de um espaço afetivo, ao longo dos anos a partir de diversos discursos que lhe atribuíram determinadas características físicas e que o investiram de inúmeros atributos morais, culturais, simbólicos. Pensar o nordeste é mencionar os aspectos climáticos a tropicalidade, a sexualidade das mulatas é falar de gente preguiçosa, promíscua, improdutiva e violenta. Ou seja, é inventar estereótipos e mitos que emergiram no próprio espaço físico mobilizando todo um universo de imagens negativas e positivas socialmente reconhecidas e consagradas que criaram a idéia de Nordeste. Dessa forma, o autor se propõe a um trabalho ao mesmo tempo arqueológico e genealógico do Nordeste. Trata-se de desconstruir os discursos foucaultianos que deram visibilidade a divisão do Nordeste nos marcos de modernidade. Ainda que definindo sua identidade ou impondo o seu atraso supostamente natural resultado das difíceis condições climáticas. Mostra como o Nordeste foi recortado na maioria das vezes e na maior parte das vezes de forma negativa e pejorativamente, como o sudeste e o sul agilizados como espaços de progresso, da razão e do futuro. Nesse contexto se opera a destruição da idéia do Nordeste. O autor preocupado em romper com a lógica identitária busca encontrar a diferença onde ela se encontra, decifrando suas próprias condições e possibilidades de decodificação das regras enunciadas. Ele denuncia os mecanismos insidiosos do poder presentes nas configurações discursivas e envolvidas numa negociação em que se paga alto preço por uma forma particular de surgimento que implica evidentemente em aceitação e rejeição, em incorporação e exclusão. Vale salientar que este estudo não se limita a uma história de acusações e culpas em especial de uma classe contra outra, mas propõe-se reconhecer a existência das enormes diferenças sociais do país. Nesta história política, os nordestinos não são vitimizados, mas aparecem como participantes da construção cultural do Nordeste, na medida em que se subjetivam enquanto nordestinos, a partir das referências sociais que foram estabelecidas tanto interiormente ou exteriormente na região. Percebe-se que nesse processo de subjetivação os próprios nordestinos construíram uma identidade que não é nem natural nem essencial, mas eles se nordestinizaram instalando-se na dicotomia binária que opõe Nordeste e Sudeste, improdutivos e trabalhadores, rural e urbano, atraso e progresso, pobreza e riqueza. Sendo assim, a temática também é pioneira porque enuncia pela primeira vez dando visibilidade a questão problemática da identidade do nordestino e da invenção do nordeste, proporcionando desestabilizar velhas concepções históricas, teóricas e políticas forçando a repensar o papel do historiador. Este trabalho desfaz noções essencialistas instauradas na região nordeste. É uma obra de cunho político que denunciam múltiplas e sofisticadas formas de exclusão social e cultural no âmbito dos mecanismos construídos culturalmente, das tecnologias disciplinares, das estratégias invisíveis do poder no campo discursivo. Nesse contexto entra em jogo a crítica do discurso vigente da modernidade, da ciência, do progresso da maneira pela qual define o Nordeste. É uma crítica reveladora, desveladora, transparente, contestadora e irreverente. O autor nos leva a refletir acerca da necessidade de rever os conceitos construídos ao longo dos anos sobre a tradição, desligitimar detonar o passado e partir de novos olhares e de novas potencialidades para a construção de um novo Nordeste. Pensar, se o nordeste foi inventado para ser este espaço de barragem da mudança da modernidade, é preciso destruí-lo para poder dar lugar a novas espacialidades de poder e de saber, recriá-lo diferentemente livre das pesadas heranças do passado, sem estigmas, sem preconceitos. Ainda podemos acrescentar que ao analisarmos o texto intitulado: Geografia em Ruínas foi possível compreender os caminhos pelos quais se produziram no âmbito cultural, o Nordeste. Nele se encontra poder e linguagem onde se dá a produção imagética e textual da espacialização das relações de poder. Este trabalho tematiza, pois, o estabelecimento de uma nova forma de dizer e ver o regional, que abre caminhos para novas formas de sentir e de conhecer. O Nordeste é tomado, neste texto, como invenção pela repetição regular de determinados enunciados, que são tidos como definidores do caráter da região e de seu povo, que falam de sua verdade mais interior. A regionalização das relações de poder acompanhada de outros processos de regionalização, como o de produção, o das relações de trabalho e das práticas culturais. A região é produto de uma batalha, é uma segmentação surgida no espaço dos litigantes. Albuquerque privilegiou o debate em torno da idéia de Nordeste, como ele foi inventado, buscando perceber determinados enunciados audiovisuais que se produziram e cristalizaram-se como representações deste espaço. Ainda questionou-se a idéia de identidade, haja vista que a identidade nacional e regional é vista como uma construção mental. O regionalismo é muito mais do que uma ideologia de classe dominante de uma região. Ele se apóia na prática regionalista, na produção de uma sensibilidade regionalista, numa cultura, que são levadas a efeito e incorporadas por várias camadas da população e surge como elemento dos discursos destes vários segmentos. O autor procurou além disso ressaltar as condições que se impuseram estes sujeitos, os introduziram e fizeram funcionar como tal em determinado momento ao mesmo tempo como inventaram o Nordeste, iam se inventando como sujeitos nordestinos. Percebemos assim as transformações históricas que possibilitaram a emergência da idéia de Nordeste, desde a emergência do dispositivo das nacionalidades, passando por uma mudança na sensibilidade social em relação entre olhar e espaço trazido pela modernidade e pela sociabilidade burguesa, urbana de massas. Assim, essas mudanças permitem a emergência deste novo regionalismo e que possibilitou a invenção do Nordeste. Dessa forma, a invenção do Nordeste segundo Durval Muniz de Albuquerque Junior, doutor em História pela Unicamp, faz uma apaixonante investigação de como e quando se formou o que hoje compreendemos como o Nordeste brasileiro. Ainda argumentando o autor diz: “O Nordeste é uma produção imagético-discursiva, gestada historicamente”. As mesmas imagens e enunciados sobre a região aparecem em formulações naturalistas, culturalistas etc. Portanto, de olho nas artes e na literatura e outro na história social, esta obra examina a gênese da região, remetendo-nos à constatação de que o Nordeste é uma invenção recente na história brasileira talvez um filhote da modernidade. Esta obra é um alerta à indiferença pela historicidade e aos perigos dos discursos monólogos produzidos ao longo da história humana. A invenção do Nordeste contribui para despertar a busca pela democratização da cultura, evitando a hegemonia, por isso, representa um processo de resistência. Vale ressaltar que este trabalho acadêmico foi muito significativo, haja vista que possibilitou o acesso a uma leitura extremamente significativa para os estudos presentes.

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